Polêmica fotográfica

O suplemento do “The New Tork Times” que a Folha de São Paulo publica as segundas-feiras sempre tem informações muito interessantes.

No dia 14 de dezembro, trouxe uma matéria assinada por Steven Erlanger em que ele conta um pouco da polêmica existente na França em relação às fotos de publicidade. Principalmente fotos femininas. A discussão, proposta por uma parlamentar, gira em torno de se informar ou não se as fotos são manipuladas por computador.

A matéria completa reproduzo, na íntegra, logo abaixo.

 

França debate assinalar fotos alteradas digitalmente

Por STEVEN ERLANGER

PARIS - Valérie Boyer tem 47 anos, é deputada do Parlamento francês e mãe divorciada de três filhos. É alta, elegante e esbelta. Mas criou um pequeno furor na França e fora do país com sua proposta mais recente: um projeto de lei que tornaria obrigatória a publicação de um aviso em todas as fotos digitalmente alteradas de pessoas que figuram em comerciais, identificando-as como retocadas.

Alguns consideram que a lei pode destruir a arte fotográfica; outros pensam que ela pode ajudar a reduzir a incidência de anorexia, e ainda outros dizem que ela mira o alvo errado, dado que quase todas as fotos publicitárias passam por retoques. Outras, ainda, acham que o rótulo de retocada pode conscientizar as pessoas da falsificação envolvida na maioria das imagens usadas em publicidade.

Sob tudo isso há uma discussão carregada de emoção sobre o que é a beleza ou a falta dela. "Michelangelo pintou corpos idealizados. A ideia da beleza idealizada já estava ali", disse Anne-Florence Schmitt, editora da "Madame Figaro", a revista feminina do jornal "Figaro". "É um falso debate."

Para Boyer, a disputa diz respeito, na realidade, a suas duas filhas adolescentes, de 16 e 17 anos, e às pressões impostas às mulheres jovens para que se enquadrem no ideal da moda de um corpo magro.

"Se uma pessoa quer sucesso, quer se sentir bem em sua própria pele, ela precisa ser magra ou magérrima, e nem sequer isso basta -precisa ter seu corpo transformado com softwares de imagem. Ingressamos num mundo padronizado e cerebralmente lavado. Quem não segue [o padrão] é excluído da sociedade."

Sua lei proposta ainda precisa ser votada na Assembleia Nacional, onde Boyer é deputada de centro-direita representando Marselha. A legislação lhe valeu atenção como parte de uma discussão mais ampla, confusa e que desperta muitas paixões, acerca de modelos, beleza e anorexia.

Nos EUA, a revista "Self", que defende que as pessoas aceitem seu "verdadeiro eu", publicou recentemente uma imagem "emagrecida" da cantora Kelly Clarkson, sob uma manchete defendendo a "confiança corporal plena". Lucy Danziger, sua editora, defendeu a foto, dizendo que é "a mais verdadeira que já publicamos", mas muitos discordaram.

No mês passado, a popular revista feminina alemã "Brigitte" decidiu que a partir de 2010 usará apenas fotos de mulheres "comuns". Seu editor, Andreas Lebert, se disse "farto" de retocar fotos de modelos que considera estarem abaixo do peso ideal.
Na França, a fotógrafa de moda francesa Dominique Isserman acha que Boyer não entendeu a natureza da própria fotografia. "Existe uma ilusão de que a fotografia é 'fiel'", disse ela. Mas uma câmera pode facilmente distorcer a realidade através do uso de lentes diferentes, sem retoques.

Ela chamou a atenção para sua conhecida foto de Keira Knightley feita para a Chanel. A maioria das pessoas pensa que a foto foi retocada para aumentar o seio parcialmente exposto de Knightley, disse Isserman, mas na realidade o retoque feito foi "para acrescentar um pouco a suas coxas. Ela é magra demais nessa região".

"Entre Botero e Giacometti, o mundo encontra seu caminho", disse a fotógrafa. "Queremos ver pessoas celestiais sob uma luz celestial. É o paraíso da imagem."

Mas há quem, na França, seja favorável à proposta de Boyer. Philippe Jeammet, professor de psiquiatria na Universidade Paris Descartes, disse que fotografias "são um fator de influência, especialmente para as meninas mais vulneráveis". "Fotos retocadas são uma ilusão. Precisamos pensar nas consequências."


Colaborou Maïa de la Baume

Crédito da foto: aqui

Cesar Pazinatto
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Posted via email from cesar pazinatto

Comentários

Mual disse…
O difícil aqui é fazer o corte de onde acaba a realidade e onde começa o retoque. Até o mundo real é manipulavel (vide os mágicos e ilusionistas). Antes do photoshop as lentes, luzes, clima, e retoques com pincel iam no mesmo caminho, só que poucos detinham o essa tecnologia e a midia não era tão desenvolvida. Já em 1858 Henry Peach Robinson é autor de uma famosa fotografia (Fading Away - ww.rleggat.com/photohistory/history/robinson.htm)resultante da montagem de 5 negativos diferentes. Como se ve não é nada tão novo assim. O comentário é que a imagem pode ser um fator de influencia nas garotas mais vulneráveis ? Talvez seja melhor se preocupar em tratar a vulnerabilidade delas (a tudo e não só as imagens)do que se preocupar em tentar traçar um vago limite entre uma liberdade de expressão razoavel ou não. Muitos jornais só aceitam arquivos de imagens gerados diretamente das cameras fotograficas, o que parece bem razovel para a credibilidade da cena. Mesmo assim, uma cena que teve apenas seus tons e contrastes alterados foi desclassificada de um concurso pq a manipulação foi "exagerada". De novo, dificil é conseguir mensurar onde está este limite. O que é exagerado e o que não é.
Muito boa a sua contribuição. É um assunto realmente difícil. Suas explicações ajudam muito a refletir sobre os exageros dos dois lados.
Conversei recentemente com um fotógrafo em Paraty e a posição dele é muito semelhante a sua.