Reter ou não reter. Esta é a questão?

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Ao final de 2010, como todo final de ano, lidei com as mais diversas reações dos alunos reprovados e de suas famílias.
Alguns entendem a situação. Outros tentam entender. Sem falar naquelas que pedem a aprovação “por decreto” e prometem que no ano seguinte(?) vão acompanhar(?) de perto o desempenho do filho ou da filha.
Algumas reações me surpreenderam, mas por respeito ao momento, sempre difícil, não as comentarei.
Procuro sempre acolhar as famílias e os alunos que passam por essa situação, porém o trabalho de apoio e estímulo só tem início real com o começo do ano escolar seguinte.
Ontem, 3 de janeiro, a Folha de São Paulo publicou a matéria “Revendo Conceitos” que trata justamente do assunto.
Reproduzo abaixo na íntegra.


REVENDO CONCEITOS
Condenada por muitos educadores, reprovação pode ter lado bom, sobretudo para adolescentes; repetentes dizem que amadureceram e aprenderam mais



ESTÊVÃO BERTONI e FABIANA REWALD de SÃO PAULO


No mês passado, a estudante Thaís Vaz, 17, chegou triste em casa, ao voltar de uma formatura de terceiro ano. Era para ter sido sua festa também, mas, como repetiu o oitavo ano, terá de esperar um pouco mais para festejar o fim do ensino médio.
Apesar de ainda considerar a experiência da reprovação dolorosa, hoje Thaís consegue enxergar aspectos positivos: amadureceu, ficou mais cuidadosa com as escolhas que faz e diz ter feito as melhores amigas de sua vida na turma mais nova.
Estudos mostram que alunos que repetem de ano acabam tendo desempenho pior nas séries seguintes.
Casos como o de Thaís, no entanto, mostram que a reprovação não pode ser vista como algo essencialmente ruim, principalmente quando o aluno já tem idade para ver com mais clareza as suas consequências.
A mãe de Thaís, Debora Vaz, diretora pedagógica do colégio Castanheiras (Grande SP), lembra que a filha carregava problemas desde a época da alfabetização.
Thaís tinha dificuldades em matemática e física, que diminuíram após a reprovação, apesar de ainda persistirem. "No ano que eu repeti, aprendi as matérias que não tinha aprendido", diz.
Com base no exemplo da filha, Debora defende, como educadora, que a reprovação às vezes é benéfica. "Os pais falam: "E a autoestima quando meu filho repetir?". Eu sempre respondo: "E a autoestima em se sentir sempre o último, correndo atrás?'".
O LADO BOM
Para o estudante Henrique Capanema, 14, ver algo de positivo assim que foi reprovado, em 2007, no sexto ano, foi difícil. "No momento em que eu soube, fiquei desestimulado, mas saí dessa fase depois de um bom tempo."
Antes com dificuldades em ciência, história e inglês, ele conta que continua tendo problemas apenas com a primeira. "Meu inglês evoluiu muito, e história é uma das minhas matérias favoritas."
Marcos Miranda, 25, estudante de geografia da USP, também diz que repetir o segundo ano do ensino médio teve seu lado bom. "Foi um choque tão grande que eu meio que acordei", conta.
Mas no caso dos alunos mais novos, principalmente, a reprovação é hoje vista como ruim. Ao menos para o CNE (Conselho Nacional de Educação), órgão ligado ao Ministério da Educação.
Em dezembro, foi publicada uma resolução em que o CNE recomenda que não haja reprovação nos três anos iniciais do ensino fundamental -o chamado ciclo de alfabetização e letramento.
"É muito importante que, nessa fase, dos seis aos oito anos de idade, todos respeitem as diversidades do processo de amadurecimento das crianças", afirma Cesar Callegari, conselheiro da Câmara de Educação Básica.
CICLOS
A adoção do sistema de ciclos -em que o aluno não é reprovado ao final de cada série, mas apenas ao final de um bloco delas- tornou-se possível com a Lei de Diretrizes e Bases, de 1996.
A rede pública do Estado de São Paulo começou a usar o modelo em 1998 como forma de evitar a evasão.
"Em famílias de mais baixa renda e de nível educacional precário, a repetência é, muitas vezes, pretexto para rotular e considerar os filhos incapazes para o estudo, levando-os a se evadir da escola", diz a consultora em educação Regina de Assis.
Callegari afirma, no entanto, que os objetivos da resolução do CNE são outros.
"Não é uma medida preventiva contra a evasão, mas para combater o descompromisso de professores, redes e gestores de escola em relação à efetiva aprendizagem dos alunos", diz o conselheiro.

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