A matéria abaixo saiu no dia 23 de maio de 2012 no Jornal da Tarde.
USO PRECOCE DE ÁLCOOL ESTIMULA DEPENDÊNCIA
Felipe Oda - felipe.oda@grupoestado.com.br
A dependência de álcool em pessoas
com menos de 35 anos de idade na Região Metropolitana de São Paulo está
associada ao consumo de substância iniciado na adolescência. Entre os
indivíduos que desenvolveram o problema nessa faixa etária, a maioria teve o primeiro
contato com as bebidas alcoólicas por volta dos 17 anos, segundo um novo
recorte de dados do estudo São Paulo Megacity, apresentado pelo Jornal da Tarde
em março, quando a pesquisa foi publicada pela revista científica Clinics. O
trabalho, conduzido pela psquiatra Camila Magalhães Silveira, do Instituto de
Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP (IPq-HC), ouviu mais de 5 mil
adultos na região metropolitana de São Paulo, com idade entre 18 e 65 anos.
Segundo a autora, chama a atenção entre os dados também o abuso precoce do
álcool. "Verificamos que 54% dos entrevistados alegaram ter abusado do
consumo de álcool antes dos 24 anos de idade. O abuso já pode ser um
diagnóstico de problemas importantes com as bebidas.
Herança
dos pais.
Os especialistas ressaltam que o levantamento leva
em conta adultos, pessoas que vivenciaram, quando eram adolescentes, um período
mais brando do que hoje em relação às leis para o consumo de álcool no País.
São muitos desses adultos que, agora, educam filhos adolescentes. "Pais
que experimentaram o álcool jovens são mais permissivos e tolerantes. Eles não
enxergam problema no fato de o filho reproduzir comportamentos que eles
tiveram. Acabam mascarando uma droga que, embora lícita, é prejudicial",
afirma o psiquiatra Carlos Salgado, conselheiro da Associação Brasileira de
Estudos do Álcool e Outras Drogas (Abead). Na opinião de Camila, a pesquisa
indica que as campanhas de prevenção deveriam estar cada vez mais focadas no
jovem. "É preciso falar com ele antes que o consumo abusivo da substância
ocorra", afirma. É o que as escolas de São Paulo têm tentado fazer. A lei
também acompanha esse movimento. No ano passado, o consumo de álcool por
menores de 18 anos passou a ser proibido nos estabelecimentos comerciais do
Estado, com responsabilização do proprietário em caso de descumprimentos.
Antes, embora a venda do produto já fosse ilegal para esse público, o consumo
não era regulado, de modo que muitas vezes um adulto comprava a bebida para o
jovem. A propaganda também tem papel importante no uso precoce de álcool, na
opinião do médico Williams Santos Ramos, hebiatra (especialista em
adolescentes) pela Faculdade de Medicina do ABC. "A identificação é cada
vez mais com um indivíduo jovem: aparecem a praia, o esporte, garotas bonitas.
Esses cenários são habitados principalmente por jovens."
Prejuízos físicos.
Ramos lembra que o álcool é prejudicial em qualquer
faixa etária, mas seus efeitos são ainda mais severos em crianças e
adolescentes. "O organismo do jovem está em formação, é suscetível aos
efeitos fisiológicos e psicológicos causados pelo álcool. Ele pode alterar o
metabolismo e influenciar no desenvolvimento do sistema nervoso central",
diz. Rins e fígado, assim como funções cognitivas (entre elas a capacidade de
concentração, aprendizagem e memória), podem sofrer com a substância. "Em
casos extremos, também pode ocorrer pancreatite. E os adolescentes sofrem ainda
com os problemas que atingem os adultos, como a incapacidade de avaliar riscos
e de controlar a impulsividade", lista Ramos.
Comentários